quarta-feira, 19 de março de 2014

escritos 1 - 2007

Carentes, eles fariam qualquer coisa. Revolveriam orgasmos mortos e enterrados. Ressuscitariam afetos. Pensando nas químicas deixadas de lado, pensando na insegurança que lhe causava a ausência do peso do corpo amado, pensou: que poderia ter se deleitado um pouco mais naquela noite. Que poderia ter se deitado em outra cama agora tão distante dali. Imaginou-se, como na noite seguinte, perdida de si mesma por algumas horas. Perdida de si mesma para outro alguém. E suas lembranças, quais seriam? O que ficara impresso em sua carne? Seria como no dia anterior?
Bêbada. Completamente bêbada. Cinco horas escondida na sombra do sol forte. Cinco horas de intermináveis caipirinhas. Sabor doce-cítrico. Bebeu tanta água salgada do mar. O importante era concentrar-se em não perder a calma. Nadava mar adentro, tonta, tentava respirar calmamente. – Fique calma. Mantenha a serenidade. É o pavor que mata. É o pavor que afoga...
Estava tão bêbada que seu corpo registrara muito pouco daquele momento. Daquela experiência quase redentora que a redimia do passado. Passado sem fôlego. Passado sem calma. A experiência, pensava, podia lhe mostrar – para o futuro – que era capaz de manter-se calma até quando estivesse praticamente inconsciente. Devagar, tentando soltar o ar dentro da água. Baixar a cabeça. Mundo sem fundo. Mundo sem coordenadas. Mundo sem visibilidade. Esverdeado. Lembrou-se, de repente, que havia esquecido aquela paisagem circular, aquela paisagem um degrau acima de onde estava, de ver o mundo ao nível da água profunda do mar.
Foi relembrando que pensou – podia ter me perdido de mim mesma como naquela tarde nadando bêbada no mar.
– Poderia ter estado com ele naquela noite...
Uma noite que fosse mais uma vez – com alguém por apenas uma vez. Foi quando se perguntou: – Então é assim que fazemos para nos sentirmos livres e poderosos? Usando alguém – apenas uma vez – para afastarmos nossos próprios fantasmas? 

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