sábado, 29 de agosto de 2015

naquele grande livro preto...

desapego                                               
                        pegadas
marcas na areia levam para o mar
pego teu músculo
seguro meu desejo
tudo deságua
através de meus olhos

se o corpo pudesse ser metáfora do desejo que vaga na alma, o amor iluminado pela luz dos teus olhos, absoluto em tal profundidade – incomensurável – que não se traduz em palavras, faz com que até o dedinho do meu pé
te deseje
faz com que cada fio de meu cabelo queira estar banhado em teu cheiro, sentir o avesso de minha carne é tocar tua pele devagar. como se nossos segredos estivessem escondidos naquele leve relevo do teu peito ou na curva da tua orelha. como se meus lábios pudessem ser a benção de minha alma derramo minha alma sobre tua testa devagar...

viver me incomodava tanto que a possibilidade da morte eminente daquela relação – morte de ameaça proporcional à importância que para mim assumia – fazia dela meu vício, meu alento... a sensação de que a vida a seu lado era plena talvez viesse da ideia de que a morte nos rondava permanentemente; como se só houvesse possibilidade de vida plena e absoluta onde morte houvesse. meu devaneio era movimentar-me constantemente – sem um segundo de descanso sequer – entre uma e outra.
era transformar meu cotidiano na afirmação reiterada de minha própria existência. existência que não reconhecia em minha capacidade de respirar – no lento e constante movimento de meu peito – mas na constante alteridade de um universo constituído por opostos – a vida e a morte – e a febre que tal movimento provocava expunha meu próprio delírio. delírio de que fosse tão grande quanto ambas e não apenas uma pequena partícula de cada uma delas.
talvez, parte do desespero, da confusão, fosse resultado da percepção do quanto te desejava e de que tal amor não fosse predestinação. eu já não podia mais assinar embaixo de meus beijos – ainda que a cada dia desejasse beijar-te mais – e a dor profunda que sentia era a dor de meu próprio reverso, era tua dor – dor de alma aprisionada – pois me sabia incapaz de apenas segurar tua mão.
no tortuoso processo de tentar entender o que comigo acontecia, um dia percebi que quanto mais me afastava de ti, mais te reconhecia em mim mesma... e a ausência de predestinação confrontou-me com o fato de que não havia segurança alguma em meu próprio querer (eu que sempre tivera tanta certeza)...

nada era preciso
                                                  além do silêncio
                                                 para contar-te
meus segredos 

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