desapego
pegadas
marcas na areia levam para o mar
pego teu músculo
seguro meu desejo
tudo deságua
através
de meus olhos
se o
corpo pudesse ser metáfora do desejo que vaga na alma, o amor iluminado pela
luz dos teus olhos, absoluto em tal profundidade – incomensurável – que não se
traduz em palavras, faz com que até o dedinho do meu pé
te
deseje
faz
com que cada fio de meu cabelo queira estar banhado em teu cheiro, sentir o
avesso de minha carne é tocar tua pele devagar. como se nossos segredos
estivessem escondidos naquele leve relevo do teu peito ou na curva da tua
orelha. como se meus lábios pudessem ser a benção de minha alma derramo minha
alma sobre tua testa devagar...
viver
me incomodava tanto que a possibilidade da morte eminente daquela relação –
morte de ameaça proporcional à importância que para mim assumia – fazia dela
meu vício, meu alento... a sensação de que a vida a seu lado era plena talvez
viesse da ideia de que a morte nos rondava permanentemente; como se só houvesse
possibilidade de vida plena e absoluta onde morte houvesse. meu devaneio era
movimentar-me constantemente – sem um segundo de descanso sequer – entre uma e
outra.
era
transformar meu cotidiano na afirmação reiterada de minha própria existência. existência
que não reconhecia em minha capacidade de respirar – no lento e constante
movimento de meu peito – mas na constante alteridade de um universo constituído
por opostos – a vida e a morte – e a febre que tal movimento provocava expunha
meu próprio delírio. delírio de que fosse tão grande quanto ambas e não apenas
uma pequena partícula de cada uma delas.
talvez,
parte do desespero, da confusão, fosse resultado da percepção do quanto te
desejava e de que tal amor não fosse predestinação. eu já não podia mais
assinar embaixo de meus beijos – ainda que a cada dia desejasse beijar-te mais –
e a dor profunda que sentia era a dor de meu próprio reverso, era tua dor – dor
de alma aprisionada – pois me sabia incapaz de apenas segurar tua mão.
no
tortuoso processo de tentar entender o que comigo acontecia, um dia percebi que
quanto mais me afastava de ti, mais te reconhecia em mim mesma... e a ausência
de predestinação confrontou-me com o fato de que não havia segurança alguma em
meu próprio querer (eu que sempre tivera tanta certeza)...
nada
era preciso
além do silêncio
para
contar-te
meus
segredos
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