quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Just be yourself anyway that you want to, babe... Just be yourself anyway that you can...













Senhoras e senhores componentes da mesa, familiares e amigos destes formandos, queridas afilhadas e afilhado, boa noite!

Sim, minha mensagem para vocês baseia-se na música do grupo Morcheeba cujo refrão ouvimos [Just be yourself anyway that you want to; just be yourself anyway that you can...]. Apenas seja você mesmo, diz a letra. Apenas seja você, como você quiser, como você puder. Sim, eu repito, sejam apenas  vocês mesmas!
Mensagem bacana, não? Como se eu estivesse dizendo a vocês: “Não se preocupem, tudo vai funcionar, tudo vai dar certo, desde que vocês sejam vocês mesmas”. Apenas, sejam vocês mesmos!
Mas esta mensagem tão “bacana”, que de tão bacana parece argumento de milhares de propagandas, fala de algo que é bem mais difícil do que parece. Afinal, quem somos nós?
Esta pergunta me faz pensar em filmes. Sim, filmes. Filmes como O dia depois de amanhã, Amargedon, Guerra dos Mundos, Impacto Profundo, 2012. Tenho certeza que vocês viram algum desses filmes. Todos eles são "filmes catástrofe". Filmes cujo enredo envolve a destruição do mundo ou a ameaça de destruição da raça humana, coisas que sempre agradam ao público. Porque será que ameaças de destruição agradam tanto? Ou o que agrada ao público são os finais? Até porque nos finais todo mundo sempre se salva. Ou, pelo menos se salvam o herói e seus amigos e parentes próximos, não é isso? Ah, sim, é por isso que falei destes filmes... o herói! O que seria da raça humana sem o herói?
Mas, quem é o herói? Nestes filmes, assim como em vários da mesma linha, o herói é aquele sujeito corajoso e ousado que se lança na empreitada de salvar-se e salvar aos outros e, geralmente, acaba conseguindo salvar as pessoas que ama. Não sei se gosto muito deste argumento, até porque, que mérito há em salvarmos quem amamos? Isso é o mínimo que se espera de um herói, ou não? Que ousadia há afinal em ser herói dentro do limite tão pequeno de seus próprios afetos? Ousadia não seria batalhar para salvar o outro? O outro que também é você porque também é humano? Hum... desconfio que em alguns filmes catástrofe alguns humanos são mais humanos do que outros... a esses filmes falta pensar com um pouco mais de generosidade o que significa, afinal ser humano.   
Há alguns dias atrás, vi um outro filme catástrofe, feito pelo Lars von Trier, que chama-se Melancolia. Melancolia é um filme catástrofe porque trata de um cometa, chamado Melancolia, que vai atingir a Terra e destruí-la. Melancolia não tem herói, mesmo que só se descubra isto mais para o final do filme. Gostei muito quando vi este filme e imediatamente pensei: “nossa, que legal, este é o primeiro filme catástrofe que vejo que é verdadeiramente humano”.
Mas o que é isso que chamo de “verdadeiramente humano”? Verdadeiramente humano é o medo. Verdadeiramente humana é a coragem. Verdadeiramente humano é sabermos que o mundo, na realidade, não se divide facilmente entre “os maus” e “os bons”. Verdadeiramente humano é nos sentirmos, tantas vezes, divididos entre nossos desejos e nossa falta de amor próprio. Verdadeiramente humana é a dificuldade de conhecer-se de fato.
Melancolia me lembrou de outro filme sem heróis, Crash – no limite, que, a princípio parece ser um filme cheio de heróis. Mas, que, em seu desenrolar, nos revela que nunca sabemos quem realmente somos, até que, somos obrigados a reagir a uma “catástrofe”.
Melancolia, afinal, talvez não seja um filme catástrofe, mas uma linda história – cheia de menções às artes plásticas – sobre a humanidade. Sobre a relação da humanidade com a vida. Melancolia e Crash são filmes sobre como seres humanos enfrentam de fato, na hora “h” as catástrofes. Ser herói, de fato, e isso estes dois filmes nos mostram, é ser verdadeiramente, humano. Verdadeiramente humana é nossa capacidade de compreensão deste fenômeno chamado vida e de sua necessária complementariedade, a morte.
Recentemente, testemunhei um momento de grande humanidade, num outro auditório da Universidade. 27 de junho de 2011. Auditório do prédio 6. E por favor me desculpem, queridas afilhadas por não citar pessoalmente cada uma de vocês... Neste dia, 27 de junho, no palco do auditório, estava a Michele apresentando o seu Trabalho de Curso com a ajuda da Daniela. A Michele, ofegante, mas serena, lidando com sua dificuldade de fala e locomoção. Dificuldade com a qual lidou durante toda a vida, durante todo o curso, mas que não a impediu de realizar seu sonho. A Daniela, ajoelhada em frente à Michele, segurando para ela o microfone. A Daniela, que é uma menina linda, inteligente, com nenhuma dificuldade para ir e vir, fazer e acontecer. E a vida, tão grande colocou as duas ali no palco para nos mostrar que o único caminho para a aprendizagem é a coragem, que o único caminho para a ousadia, é a humildade. Exemplo de humanidade dessas duas foi perceber que não há limites, para as realizações e para o afeto. Humanidade heróica é isso!
Sim, sejam apenas vocês mesmos. Mas, por favor, lembrem-se sempre de desconfiar de vocês próprios! E lembrem, sempre do exemplo da Daniela e da Michele: deste exemplo de dedicação! Enquanto dica de madrinha para a vida futura de vocês, profissional e pessoal, repito, desconfiem de vocês próprios. Desconfiem de suas certezas, de seus afetos, de suas mágoas. Há muito mais em nós do que conseguimos nos revelar ao olharmo-nos ao espelho.
A linha que separa a coragem da temeridade chama-se humildade.
A linha que separa a liberdade da frustração chama-se ousadia.
Dosar humildade e ousadia, coragem e liberdade o que nos faz, de fato, mais humanos!
Sejamos todos, apenas, mais humanos.

Muito obrigada.


Ouro de artista é amar bastante!
Mensagem da Paraninfa aos alunos formandos em Artes Visuais 
turma 2011/1, em 5 de agosto de 2011.


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